A compra de pólvora por CACs — Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores — é uma atividade legal no Brasil, porém fortemente regulamentada. O controle é exercido pelo Exército Brasileiro, que estabelece normas detalhadas sobre quem pode adquirir, quais são os limites, como funciona o processo de compra e quais são as obrigações de armazenamento e transporte.
Neste artigo, você entenderá como o sistema funciona na prática: desde a obtenção do Certificado de Registro (CR) até os cuidados necessários após a compra.
O que é um CAC e por que o CR é essencial
O termo CAC engloba três categorias de pessoas físicas autorizadas a lidar com Produtos Controlados pelo Exército (PCE):
- Colecionadores, que mantêm armas e munições históricas.
- Atiradores desportivos, que utilizam armas e munições em competições esportivas.
- Caçadores, que realizam o abate de animais silvestres com autorização do Ibama.
Para exercer qualquer uma dessas atividades, é obrigatório possuir o Certificado de Registro (CR), documento emitido pelo Exército Brasileiro.
O CR é o que autoriza o titular a adquirir, transportar e armazenar produtos controlados, como pólvoras, munições, espoletas e projéteis. Sem ele, qualquer compra é considerada ilegal.
O que é a pólvora e por que é controlada
A pólvora é um material explosivo utilizado para impulsionar o projétil em uma munição. No Brasil, ela é classificada como Produto Controlado pelo Exército (PCE). Isso significa que sua fabricação, comercialização, transporte, posse e uso estão sujeitos a regras rígidas.
Esse controle existe por motivos óbvios de segurança pública, já que a pólvora é um insumo de alto risco. O Exército atua para garantir que o material seja manipulado apenas por pessoas capacitadas e em condições adequadas.
Principais normas que regulam a compra
A compra de pólvora por CACs é regida por um conjunto de normas que se complementam. As principais são:
- Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento), que estabelece as regras gerais sobre armas e munições.
- Decretos que regulamentam a lei, atualizados ao longo dos anos para definir critérios e competências.
- Regulamento R-105, que disciplina o controle de produtos controlados.
- Portarias do Comando Logístico (COLOG), que especificam detalhes sobre aquisição, limites e armazenamento — como a Portaria COLOG nº 166/2023, atualmente em vigor.
Essas normas determinam não só quem pode comprar, mas também quanto, onde e de que forma cada compra deve ocorrer.
Limites de compra de pólvora
A legislação impõe limites anuais para aquisição de pólvora por CACs, variando conforme o tipo de atividade (caça, tiro ou coleção) e o nível de certificação do CR.
De maneira geral:
- Atiradores iniciantes podem adquirir quantidades menores, destinadas à recarga e treino pessoal.
- Atiradores de nível mais alto e competidores ativos podem solicitar autorização para volumes maiores, mediante justificativa e registro atualizado no Exército.
- Caçadores possuem limites específicos voltados à sua prática.
Esses limites são definidos em quilogramas por ano e constam nas portarias internas do Exército. A compra acima do limite só é possível mediante autorização especial, que deve ser solicitada junto ao órgão fiscalizador.
Passo a passo para comprar pólvora legalmente
1. Obtenção do Certificado de Registro (CR)
O primeiro passo é obter o CR junto ao Sistema de Gestão Corporativo (SisGCorp) do Exército. O processo inclui:
- Comprovação de idoneidade (nada consta criminal).
- Laudo psicológico e de aptidão técnica.
- Vínculo com entidade de tiro ou federação.
- Pagamento de taxas e entrega de documentos.
Após a análise e deferimento, o solicitante passa a ter autorização formal para adquirir produtos controlados.
2. Solicitação de autorização de compra
Com o CR ativo, o CAC deve verificar qual o limite anual permitido e se precisa de autorização adicional. Caso ultrapasse o limite padrão, é necessário protocolar um pedido formal junto ao Exército, informando:
- Quantidade desejada.
- Tipo de pólvora.
- Finalidade (treino, competição, recarga, caça, etc.).
A autorização tem validade determinada e deve ser apresentada no momento da compra.
3. Compra em loja credenciada
A pólvora só pode ser vendida por empresas com registro no Exército, conhecidas como comércios de Produtos Controlados (PCE).
No ato da compra, o comprador precisa apresentar:
- Documento de identidade.
- CR válido.
- Autorização de compra (quando exigida).
A loja registra a venda no sistema e emite a nota fiscal ou ficha de controle, que deve ser guardada pelo comprador.
4. Armazenamento e transporte
A pólvora deve ser mantida em local ventilado, seco e seguro, longe de fontes de calor e chama.
O transporte deve seguir orientações do Exército, sempre com os documentos comprobatórios em mãos.
A negligência no armazenamento pode resultar em cassação do CR, multas e até responsabilização criminal em caso de acidente.
Tipos de pólvora e suas finalidades
No Brasil, a legislação permite que CACs adquiram basicamente dois tipos de pólvora:
- Pólvora negra: utilizada em armas históricas, de antecarga ou reproduções antigas — mais comum entre colecionadores.
- Pólvora sem fumaça (nitrocelulose): usada na recarga de munições modernas. É o tipo mais buscado por atiradores esportivos e caçadores.
Cada tipo exige cuidados específicos de armazenamento, pois possuem diferentes graus de sensibilidade térmica e química.
Responsabilidades do comprador
Ao adquirir pólvora, o CAC assume uma série de responsabilidades legais e práticas:
- Usar o produto apenas para o fim autorizado.
- Não revender ou repassar a terceiros.
- Armazenar de forma segura e em conformidade com as normas técnicas.
- Manter registro atualizado das compras e estoques.
- Apresentar documentos e comprovantes sempre que solicitado em fiscalizações.
O descumprimento de qualquer uma dessas obrigações pode gerar infrações administrativas e até crime de posse ilegal de explosivos.
Fiscalização e penalidades
A fiscalização é feita pelo Exército Brasileiro, por meio das Regiões Militares e dos Serviços de Fiscalização de Produtos Controlados (SFPC).
Durante as inspeções, o militar fiscal pode:
- Verificar as condições do depósito ou armário.
- Conferir notas fiscais e autorizações.
- Avaliar se o armazenamento segue as normas de segurança.
Entre as penalidades possíveis estão:
- Advertência ou multa.
- Suspensão ou cassação do CR.
- Apreensão de materiais.
- Encaminhamento do caso à Justiça Militar ou Federal.
Armazenamento doméstico seguro
Mesmo pequenas quantidades de pólvora devem ser guardadas com extremo cuidado. Algumas recomendações importantes:
- Nunca fume ou use chama próxima.
- Evite contato com superfícies metálicas que possam gerar faíscas.
- Mantenha em embalagens originais, bem fechadas.
- Armazene em armário ventilado e trancado, longe do alcance de crianças e visitantes.
- Evite locais com variação térmica alta, como sótãos e porões.
O ideal é manter um ambiente seco, estável e identificado como área de risco controlado.
O papel das empresas autorizadas
As lojas que vendem pólvora também seguem rígidas exigências:
- Devem possuir autorização específica do Exército.
- Contar com depósito seguro e isolado.
- Manter livro de registro de todas as vendas e estoques.
- Informar o Exército periodicamente sobre movimentações.
Essas empresas passam por vistorias regulares, e qualquer irregularidade pode resultar na suspensão da licença.
Alterações recentes na legislação
Nos últimos anos, houve diversas mudanças nos decretos e portarias que regem a atuação dos CACs.
A tendência tem sido aumentar o controle sobre insumos de recarga, exigindo:
- Atualização constante do CR.
- Registro detalhado das compras.
- Sistemas digitais de acompanhamento.
- Fiscalizações mais frequentes.
O objetivo dessas medidas é reforçar a rastreabilidade da pólvora e reduzir riscos de desvio ou uso indevido.
Por isso, é fundamental que cada CAC acompanhe as atualizações do Exército, consultando sempre a última versão das portarias.
Erros comuns que devem ser evitados
- Comprar de fontes não autorizadas.
Mesmo que o vendedor possua o produto, a venda sem registro é ilegal. - Armazenar em grandes quantidades.
O excesso de pólvora em casa pode caracterizar crime e gerar apreensão imediata. - Transportar sem documentação.
É obrigatório portar o CR e a nota fiscal durante qualquer deslocamento. - Ignorar fiscalizações.
O não atendimento a uma solicitação do Exército pode levar à suspensão do registro. - Compartilhar insumos com outros atiradores.
A transferência de PCE só é permitida com autorização expressa.
Dicas para quem pretende começar a recarregar
- Faça um curso de recarga de munições reconhecido por entidades de tiro.
- Invista em equipamentos de qualidade, com balanças, prensas e dosadores confiáveis.
- Siga tabelas oficiais de recarga, nunca misture pólvoras de tipos diferentes.
- Registre cada recarga: data, quantidade, lote e tipo de projétil usado.
- Armazene separadamente as pólvoras e munições prontas.
A recarga é uma prática segura quando feita com responsabilidade e conhecimento técnico.
Resumo geral
- Pólvora é um produto controlado. Só pode ser comprada com CR emitido pelo Exército.
- O CAC deve respeitar limites anuais de compra, definidos por portaria.
- A venda só ocorre em lojas credenciadas. É proibida a revenda informal.
- O armazenamento precisa seguir normas de segurança.
- Fiscalização é constante, e penalidades são severas para quem descumpre as regras.
A compra de pólvora por CAC no Brasil é um direito garantido, mas cercado de responsabilidade. O sistema foi criado para equilibrar o acesso legítimo de praticantes de tiro, caça e colecionismo com a necessidade de segurança pública.
Com o Certificado de Registro em dia, respeito aos limites de aquisição e atenção às normas de armazenamento e transporte, o CAC pode exercer suas atividades com tranquilidade e dentro da legalidade.
Em um país de forte tradição em tiro esportivo e caça controlada, a legalidade e o cuidado são as melhores formas de preservar o direito à prática e a segurança de todos.

