O Curso de Mergulhador de Combate (C-MEC) é uma das formações mais desafiadoras e respeitadas das Forças Armadas Brasileiras, conduzido pela Marinha do Brasil para preparar militares do Grupamento de Mergulhadores de Combate (GRUMEC). Conhecidos como os “SEALs brasileiros”, os mergulhadores de combate (MECs) são especialistas em operações especiais em ambientes aquáticos, ribeirinhos e terrestres, desempenhando missões de alto risco que vão desde reconhecimento e sabotagem até resgate de reféns e contraterrorismo.
Este artigo detalha a história, estrutura, objetivos, fases e desafios do C-MEC, oferecendo uma visão completa sobre essa jornada de treinamento que transforma militares em verdadeiros operadores de elite.
O que é o Curso de Mergulhador de Combate (C-MEC)?
O termo “C-MEC” refere-se genericamente ao treinamento de mergulhadores de combate na Marinha do Brasil, mas é importante esclarecer que ele abrange dois cursos distintos: o Curso Especial de Mergulhadores de Combate (C-ESP-MEC), voltado para praças (cabos e sargentos), e o Curso de Aperfeiçoamento de Mergulhador de Combate para Oficiais (CAMECO), direcionado a oficiais. Ambos têm como objetivo capacitar militares para atuar no GRUMEC, uma unidade de operações especiais subordinada ao Comando da Força de Submarinos, sediada na Ilha de Mocanguê, em Niterói (RJ).
O GRUMEC é uma força altamente especializada, comparável a unidades internacionais como os Navy SEALs dos Estados Unidos e o Special Boat Service do Reino Unido. Seus integrantes são treinados para operar em cenários extremos, utilizando técnicas de mergulho, infiltração, demolição submarina e combate terrestre. O lema do grupamento, Fortuna Audaces Sequitur (“A sorte acompanha os audazes”), reflete o espírito de ousadia e resiliência exigido dos candidatos ao C-MEC.
História do Mergulho de Combate no Brasil
A origem do mergulho de combate no Brasil remonta à década de 1960, quando a Marinha reconheceu a necessidade de criar uma força especializada em operações subaquáticas e terrestres. Em 1964, dois oficiais e duas praças concluíram o curso de Underwater Demolition Team (UDT) nos Estados Unidos, precursor do atual treinamento SEAL. Essa experiência inicial plantou a semente para o desenvolvimento de uma unidade brasileira de mergulhadores de combate.
Em 1970, foi criada a Divisão de Mergulhadores de Combate na Base Almirante Castro e Silva, no Rio de Janeiro. No ano seguinte, em 1971, mais dois oficiais e três praças foram enviados à França para realizar o curso de Nageurs de Combat, trazendo técnicas francesas que enfatizavam operações de mergulho. A fusão das doutrinas americana e francesa — a primeira focada em operações terrestres e a segunda em ações subaquáticas — deu origem ao primeiro Curso Especial de Mergulhador de Combate, ministrado em 1974 pelo Centro de Instrução e Adestramento Almirante Áttila Monteiro Aché (CIAMA).
Com o aumento da demanda por operações especiais, a Divisão foi transformada, em 1983, no Grupo de Mergulhadores de Combate (GRUMEC). Em 1996, o curso para oficiais (CAMECO) foi instituído, e em 1998, o GRUMEC foi oficialmente ativado como uma organização militar com semi-autonomia administrativa. Desde então, o C-MEC evoluiu para se tornar o treinamento mais longo e rigoroso das Forças Armadas Brasileiras.
Objetivos do Curso
O C-MEC tem como missão principal preparar militares para executar operações especiais em ambientes diversos, com ênfase em missões marítimas e ribeirinhas. Os objetivos incluem:
- Capacitação Física e Mental: Desenvolver resistência física e psicológica para suportar condições extremas, como longos períodos submersos, privação de sono e estresse operacional.
- Domínio Técnico: Ensinar o uso de equipamentos de mergulho (circuito aberto e fechado), armamentos, explosivos e técnicas de infiltração.
- Versatilidade Operacional: Habilitar os militares a realizar missões como reconhecimento, sabotagem, demolição submarina, resgate de reféns e contraterrorismo em diferentes cenários.
- Formação de Líderes: No caso do CAMECO, preparar oficiais para liderar equipes em operações de alta complexidade.
Os formados no C-MEC integram o GRUMEC, onde podem atuar em divisões especializadas, como o Grupo Especial de Retomada e Resgate (GERR-MEC), focado em ações de contraterrorismo e recuperação de instalações marítimas.

Estrutura e Fases do Curso
O C-MEC é conhecido por sua duração prolongada e alta taxa de desistência. O C-ESP-MEC, para praças, tem cerca de 45 semanas, enquanto o CAMECO, para oficiais, pode chegar a 46 semanas, dividido em fases distintas. Abaixo, detalhamos a estrutura típica baseada nas informações disponíveis:
1. Fase Zero – Preparação Física (8 a 13 semanas)
- Objetivo: Condicionar os alunos fisicamente para as exigências do curso.
- Atividades: Treinamento físico intenso no Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes (CEFAN), incluindo corrida, natação, musculação e testes de aptidão (como nado com mãos e pés amarrados). Há também avaliações de composição corporal, resistência cardiorrespiratória e “aquacidade” (adaptação à água).
- Duração: Varia entre 8 semanas (C-ESP-MEC) e 13 semanas (CAMECO, com disciplinas adicionais como liderança e planejamento militar).
- Desafios: Muitos candidatos desistem nessa etapa devido à exaustão física e mental.
2. Fase Alfa – Fundamentos Técnicos (17 semanas)
- Objetivo: Introduzir técnicas básicas de mergulho e combate.
- Atividades: Treinamento físico contínuo, mergulho com circuito aberto, combate corpo a corpo, primeiros socorros e introdução a armamentos e comunicações.
- Duração: 13 semanas de preparação física mais 4 semanas de mergulho básico.
- Desafios: Os alunos começam a operar sob pressão psicológica, enfrentando simulações realistas e privações.
3. Fase Bravo – Operações Avançadas (22 semanas)
- Objetivo: Aprofundar habilidades em operações especiais.
- Atividades: Mergulho com circuito fechado (sem bolhas, ideal para infiltrações furtivas), técnicas de demolição, operações submarinas e terrestres, e treinamento em ambientes simulados de guerra.
- Duração: Dividida em duas subfases de 11 semanas cada, cobrindo desde combate em terra até operações anfíbias.
- Desafios: Longas nadadas em mar aberto (até 10 km) com equipamento completo e exercícios noturnos aumentam a exigência física e mental.
4. Fase Charlie – Estágio Avançado (6 semanas)
- Objetivo: Aplicar os conhecimentos em cenários reais.
- Atividades: Operações ribeirinhas na Amazônia ou no Pantanal, montanhismo em São João del Rei (MG), e estágio de sobrevivência na selva no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), em Manaus. A fase termina com uma operação especial simulada próxima ao Rio de Janeiro.
- Duração: 6 semanas intensivas.
- Desafios: Combinação de ambientes hostis e missões complexas testa a capacidade de adaptação dos alunos.
Requisitos e Seleção
Para ingressar no C-MEC, os candidatos devem atender a critérios rigorosos:
C-ESP-MEC (Praças):
- Ser cabo ou sargento com menos de 30 anos e possibilidade de renovação de serviço.
- Pertencer ao Corpo da Armada ou Quadro Complementar da Armada.
- Passar por exames médicos, psicológicos e testes físicos exaustivos.
CAMECO (Oficiais):
- Ser oficial do Corpo da Armada ou Quadro Complementar, geralmente na patente de segundo-tenente ou superior.
- Completar exames médicos, psicológicos e teste em câmara de recompressão.
Mulheres não são admitidas no curso, e fuzileiros navais também não podem participar, pois o GRUMEC é exclusivo para o Corpo da Armada. A seleção inicial elimina muitos candidatos, e a taxa de conclusão é baixa: em média, apenas 6 em cada 20 inscritos terminam o curso, havendo edições em que ninguém se forma.
Desafios e Rigor do Treinamento
O C-MEC é projetado para levar os candidatos ao limite. Entre os exercícios mais emblemáticos estão:
- Nado com mãos e pés amarrados: Testa a resistência e o controle emocional em situações de extremo desconforto.
- Natação em mar aberto: Distâncias de até 10 km com equipamento completo, incluindo minas e fuzis.
- Simulações de guerra: Infiltrações noturnas, ataques submersos com explosivos simulados e resgate de reféns em plataformas marítimas.
A pressão psicológica é constante, com instrutores mantendo os alunos em um estado de estresse similar ao de operações reais. O treinamento no CEFAN, na Amazônia e em áreas como Angra dos Reis (RJ) utiliza instalações de ponta e terrenos desafiadores para preparar os MECs para qualquer missão.
Equipamentos e Tecnologias Utilizados no C-MEC
O sucesso das operações do GRUMEC depende não apenas da capacidade dos mergulhadores, mas também dos equipamentos e tecnologias de ponta empregados no treinamento e em campo. Durante o C-MEC, os alunos são familiarizados com uma gama de recursos que garantem eficiência e furtividade nas missões:
- Equipamentos de Mergulho: Os MECs utilizam sistemas de circuito aberto (SCUBA) para treinamento básico e circuito fechado (rebreathers), como o Dräger LAR V, que recicla o ar exalado e elimina bolhas, essencial para infiltrações subaquáticas discretas. Esses equipamentos permitem longos períodos submersos sem detecção.
- Armamentos: Incluem fuzis como o M16 e pistolas Beretta, adaptados para uso em ambientes úmidos, além de explosivos subaquáticos para demolição de alvos como navios ou instalações portuárias.
- Tecnologia de Navegação: Os mergulhadores são treinados com bússolas subaquáticas, GPS táticos e sistemas de sonar portátil para orientação em águas escuras ou turvas.
- Vestimentas: Nadadeiras, máscaras, coletes táticos e roupas de neoprene são usadas para proteção térmica e mobilidade. Em operações especiais, podem empregar trajes secos para ambientes frios.
- Veículos de Inserção: Durante o curso, os alunos aprendem a operar embarcações como botes infláveis de casco rígido (RHIB) e submarinos de pequeno porte (SDVs – Swimmer Delivery Vehicles) para infiltração em áreas restritas.
Essa familiaridade com equipamentos avançados é testada em exercícios práticos, como a colocação de minas simuladas em cascos de navios ou a neutralização de obstáculos submersos. A manutenção e o manuseio correto desses recursos são tão cruciais quanto o condicionamento físico, pois um erro técnico pode comprometer uma missão inteira.
Após a Formação
Os formados recebem o brevê de Mergulhador de Combate e são designados ao GRUMEC. Lá, passam por um programa complementar de adestramento e podem realizar cursos adicionais, como:
- Desativação de Artefatos Explosivos (DAE).
- Paraquedismo militar (básico, salto livre e precursor).
- Operações na selva e no Pantanal.
- Montanhismo.
Os MECs participam de missões reais, como a proteção de plataformas de petróleo na Amazônia Azul, operações de paz da ONU (Haiti e Líbano) e treinamentos conjuntos com forças estrangeiras, como os SEALs americanos.
Importância Estratégica
Em um país com mais de 7.000 km de costa e vastas áreas ribeirinhas, o GRUMEC e o C-MEC são essenciais para a segurança nacional. Eles garantem a capacidade da Marinha de responder a ameaças como pirataria, terrorismo e contrabando, além de proteger ativos estratégicos como o pré-sal. O GERR-MEC, por exemplo, é a única unidade brasileira capaz de retomar plataformas de petróleo tomadas por inimigos, um diferencial reconhecido até por forças como o BOPE.
O Curso de Mergulhador de Combate (C-MEC) é mais do que um treinamento: é uma prova de determinação, habilidade e coragem. Seja no C-ESP-MEC ou no CAMECO, os militares que concluem essa jornada se tornam parte de uma elite respeitada mundialmente, pronta para enfrentar os desafios mais extremos em defesa do Brasil.
Para aqueles que sonham em ostentar o brevê de MEC, o caminho é árduo, mas a recompensa é integrar uma das unidades mais prestigiadas das Forças Armadas, onde a sorte, como diz o lema, acompanha os audazes.