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  • Última modificação do post:06/05/2025
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A Marinha do Brasil (MB) tem intensificado esforços para incorporar sistemas não tripulados em suas operações, alinhando-se às tendências globais de modernização naval. Com uma costa de 7.491 km e a vasta área da Amazônia Azul — cerca de 4,4 milhões de quilômetros quadrados de águas jurisdicionais —, o Brasil enfrenta desafios únicos em vigilância marítima, proteção de recursos naturais e defesa naval.

Os sistemas não tripulados, incluindo veículos de superfície não tripulados (VSNT), veículos submarinos autônomos (AUVs) e drones aéreos, emergem como ferramentas cruciais para atender a essas demandas, oferecendo soluções econômicas, seguras e eficientes. Este artigo analisa o panorama atual desses sistemas na MB, destacando desenvolvimentos, aplicações e comparações com outras marinhas globais.

Panorama dos Sistemas Não Tripulados na Marinha do Brasil

O uso de sistemas não tripulados na MB reflete uma resposta estratégica às exigências de monitoramento e defesa da Amazônia Azul, além de operações em ambientes de alto risco, como contramedidas de minagem e operações anfíbias. Desde 2021, o Centro de Análises de Sistemas Navais (CASNAV) lidera iniciativas como o Projeto VSNT-E (Veículo de Superfície Não Tripulado – Experimental), que converteu embarcações como a lancha URCA-III em plataformas autônomas para testes e desenvolvimento tecnológico.

Projeto VSNT-E (Agência Marinha)

Esses esforços são complementados por parcerias com universidades, como a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e financiamentos da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP).

Os sistemas não tripulados oferecem vantagens significativas: redução de riscos à vida humana, diminuição de custos operacionais e maior flexibilidade em missões prolongadas ou repetitivas. O Capitão de Mar e Guerra Cláudio Coreixas de Moraes, do CASNAV, destaca que essas tecnologias permitem “expandir a capacidade de sensores para aplicação no SisGAAz (Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul)”, além de reduzir a complexidade logística.

A MB também investe em drones aéreos, como a aeronave remotamente pilotada (ARP) NAURU 500C, rebatizada de RQ-2, que amplia as capacidades de busca e salvamento.

NAURU 500C

Veículos Submarinos Autônomos (AUVs) em Desenvolvimento

Os AUVs representam um campo promissor para a MB, especialmente para vigilância submarina, mapeamento do fundo oceânico e contramedidas de minagem. Embora o Brasil ainda esteja em estágios iniciais de desenvolvimento de AUVs próprios, parcerias com instituições como o Instituto de Pesquisas da Marinha (IPqM) têm permitido avanços significativos.

Durante os exercícios MINEX-2023 e MINEX-2024, realizados em Salvador (BA), um AUV operado pelo IPqM foi integrado ao Veículo de Superfície Não Tripulado para Contramedidas de Minagem (VSNT-CMM), demonstrando eficiência na identificação de minas navais.

Os AUVs brasileiros são projetados para operar em ambientes de alta pressão, onde humanos não podem atuar diretamente. Equipados com sonares de varredura lateral e multifeixe, esses veículos podem mapear o fundo do mar, detectar objetos submersos e realizar missões de inteligência e reconhecimento. A MB colabora com a indústria nacional, como a DGS Defense, para desenvolver cascos e sistemas de comando e controle, enquanto o IPqM foca na integração de sensores avançados.

Comparado a potências como os Estados Unidos, que investem em AUVs como o Orca XLUUV da Boeing, o Brasil enfrenta desafios tecnológicos e orçamentários. Contudo, a estratégia brasileira prioriza soluções de alto custo-benefício, aproveitando tecnologias nacionais e parcerias acadêmicas para reduzir a dependência de importações.

Orca XLUUV

Drones de Superfície para Vigilância da Amazônia Azul

Os veículos de superfície não tripulados (VSNTs) são peças centrais na estratégia da MB para proteger a Amazônia Azul. O VSNT-LAB, desenvolvido com apoio da FINEP, é uma plataforma experimental que combina robótica e sistemas de controle para realizar missões autônomas de vigilância, inteligência e contramedidas de minagem. Equipado com sonares, câmeras infravermelhas e sistemas de navegação autônoma, o VSNT-LAB foi testado com sucesso em exercícios como o MINEX-2023, demonstrando capacidade de detectar e identificar alvos submersos.

Outro exemplo é o VSNT SUPPRESSOR X, desenvolvido pela Empresa Gerencial de Projetos Navais (EMGEPRON) em parceria com a Tidewise. Esse veículo, operado a partir do Navio-Patrulha Oceânico Apa, destaca-se por sua tecnologia 100% nacional, incluindo sistemas de transmissão em tempo real e sensores avançados. A MB planeja, em 2025, adquirir novos sensores e atuadores para operar VSNTs em “enxame”, permitindo ações coordenadas entre múltiplos veículos, o que aumentará a eficiência em missões de grande escala.

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A Amazônia Azul, com sua relevância econômica e estratégica, exige vigilância constante para proteger plataformas offshore, combater atividades ilícitas e monitorar desastres ambientais. Os VSNTs oferecem uma solução econômica, com custos operacionais significativamente menores que os de navios tripulados, além de maior alcance e resistência em ambientes hostis.

Aplicações em Operações Anfíbias e Resgate

Os sistemas não tripulados também têm aplicações em operações anfíbias e de busca e salvamento (SAR). A MB utiliza drones aéreos, como o RQ-2, para ampliar o alcance visual em missões de resgate. Com autonomia de quatro horas e alcance de 60 km, o RQ-2 opera em condições adversas, com câmeras de alta resolução e transmissão em tempo real, sendo capaz de realizar pousos e decolagens verticais a partir de navios ou terra. Essas características são cruciais para localizar náufragos ou apoiar operações em áreas remotas.

Em operações anfíbias, os sistemas não tripulados oferecem suporte à Força de Fuzileiros Navais, fornecendo inteligência em tempo real e reconhecimento de áreas de desembarque. O Navio-Aeródromo Multipropósito Atlântico, equipado para operar helicópteros e drones, serve como base para essas missões, integrando ARPs como o ScanEagle para monitoramento e vigilância.

A capacidade de operar drones a partir de grandes embarcações amplia a projeção de poder da MB, especialmente em cenários que exigem rápida resposta e coordenação.

Integração com Inteligência Artificial e Machine Learning

A integração de inteligência artificial (IA) e aprendizado de máquina (machine learning) está transformando as capacidades dos sistemas não tripulados da MB. Algoritmos de IA são empregados em AUVs e VSNTs para navegação autônoma, permitindo que os veículos ajustem rotas em tempo real com base em dados de sensores, como sonares e câmeras. Por exemplo, o VSNT-LAB utiliza modelos de aprendizado de máquina para identificar padrões em dados de vigilância, como a detecção de embarcações suspeitas ou anomalias no fundo oceânico.

A MB colabora com instituições acadêmicas, como a UFRJ, para desenvolver sistemas de reconhecimento de alvos baseados em redes neurais, aumentando a precisão em missões de contramedidas de minagem. Além disso, a IA facilita a análise de grandes volumes de dados coletados por sensores, reduzindo o tempo necessário para decisões operacionais. Embora ainda em fase inicial, esses avanços posicionam o Brasil como um competidor emergente no uso de tecnologias inteligentes em operações navais.

Impacto Econômico e Estratégico na Indústria Naval Brasileira

O desenvolvimento de sistemas não tripulados tem impactos significativos na indústria naval brasileira, promovendo inovação e autossuficiência. Empresas como EMGEPRON, Tidewise e DGS Defense lideram a produção de VSNTs e AUVs, gerando empregos e fortalecendo a cadeia de suprimentos nacional. O projeto VSNT SUPPRESSOR X, por exemplo, utiliza tecnologia 100% brasileira, reduzindo a dependência de importações e os custos associados a equipamentos estrangeiros.

Além disso, o investimento em pesquisa e desenvolvimento fomenta parcerias com universidades e centros de inovação, como o IPqM e a FINEP, estimulando a formação de mão de obra qualificada. Esse ciclo de inovação reforça a Base Industrial de Defesa (BID), um pilar estratégico para a soberania nacional. A longo prazo, a expertise adquirida pode posicionar o Brasil como um exportador de tecnologias navais, especialmente para países em desenvolvimento.

Treinamento e Capacitação de Pessoal para Operações com Sistemas Não Tripulados

A operação de sistemas não tripulados exige pessoal altamente capacitado, e a MB tem investido em programas de treinamento especializados. O Centro de Instrução e Adestramento Aeronaval (CIAAN) oferece cursos para operadores de drones aéreos, como o RQ-2, focando em habilidades como pilotagem remota, manutenção de equipamentos e análise de dados de sensores. Para AUVs e VSNTs, o CASNAV conduz simulações e treinamentos práticos, frequentemente em conjunto com exercícios como o MINEX.

A colaboração com universidades, como a UFF, permite a criação de currículos voltados para robótica e sistemas autônomos, garantindo que a MB tenha recursos humanos prontos para os desafios do futuro.

Aplicações em Ciência e Pesquisa Oceânica

Além das aplicações militares, os sistemas não tripulados da MB têm grande potencial em ciência e pesquisa oceânica. AUVs equipados com sonares multifeixe são usados para mapear o fundo do mar, contribuindo para estudos geológicos e identificação de recursos minerais na plataforma continental. Durante missões na Amazônia Azul, VSNTs monitoram a biodiversidade marinha, detectando mudanças ambientais, como derramamentos de óleo ou alterações na temperatura da água.

Parcerias com instituições como o Instituto Oceanográfico da USP amplificam essas capacidades, permitindo que dados coletados por AUVs sejam usados em pesquisas sobre mudanças climáticas e conservação. Essas aplicações reforçam o papel da MB na proteção ambiental e na promoção da sustentabilidade, alinhando-se às metas globais de preservação dos oceanos.

Comparação com Tecnologias de Outras Marinhas

Quando comparada a outras marinhas, a MB está em um estágio de consolidação de suas capacidades com sistemas não tripulados, mas ainda enfrenta limitações em escala e sofisticação. Marinhas de potências como Estados Unidos, China e Reino Unido lideram o desenvolvimento de tecnologias autônomas. Por exemplo:

  • Estados Unidos: A Marinha dos EUA investe em AUVs como o Orca XLUUV, projetado para missões de longo alcance, e em USVs como o Sea Hunter, que opera autonomamente por meses. Esses sistemas são equipados com inteligência artificial avançada e têm capacidades ofensivas, além de vigilância.
  • China: A China desenvolveu o Zhu Hai Yun, um navio-mãe não tripulado que lança drones aéreos e submarinos, utilizando IA para navegação autônoma. Essa tecnologia permite operações em larga escala com mínima intervenção humana.
  • Reino Unido: A Marinha Real Britânica encomendou o Cetus XLUUV, focado em contramedidas de minagem e vigilância, com entrega prevista para 2027. O Reino Unido também doou AUVs à Ucrânia para desminagem no Mar Negro.
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Embora o Brasil não possua a mesma capacidade de investimento, sua abordagem é estratégica, focando em tecnologias nacionais e parcerias com a academia. O VSNT-LAB e o RQ-2, por exemplo, são desenvolvidos com hardware e software nacionais, reduzindo custos e promovendo autossuficiência. A MB também se beneficia de exercícios internacionais, como a UNITAS, para trocar conhecimentos e integrar suas tecnologias com as de aliados.

Perspectivas de Exportação de Tecnologia Brasileira

O desenvolvimento de sistemas não tripulados abre portas para a exportação de tecnologia brasileira, especialmente para países da América Latina e África, onde a MB já participa de missões de cooperação. Tecnologias como o VSNT SUPPRESSOR X, com seu design modular e baixo custo, têm potencial para atender às necessidades de marinhas com orçamentos limitados. A expertise adquirida em projetos como o VSNT-LAB pode ser compartilhada em programas de transferência de tecnologia, fortalecendo parcerias estratégicas.

A EMGEPRON, responsável por projetos navais, está explorando mercados internacionais, com foco em nações que buscam soluções acessíveis para vigilância marítima e contramedidas de minagem. Essa perspectiva não apenas amplia a influência brasileira no setor de defesa, mas também gera receitas para reinvestimento em pesquisa e desenvolvimento.

Inovações e Projetos em Andamento

A MB planeja avançar na adoção de tecnologias inovadoras, como operações em enxame, onde múltiplos VSNTs e AUVs trabalham de forma coordenada. Esse conceito, inspirado em sistemas como o Sea Hunter dos EUA, aumenta a eficiência em missões de larga escala, como patrulhamento ou desminagem. Além disso, a integração com fontes de energia renovável, como painéis solares em VSNTs, está em estudo para ampliar a autonomia dos veículos.

Projetos em andamento incluem a aquisição de sensores avançados em 2025 e o desenvolvimento de sistemas de comunicação subaquática mais robustos, essenciais para AUVs. A colaboração com a indústria, como a Xmobots, e centros de pesquisa, como o IPqM, continuará a impulsionar inovações, consolidando o Brasil como um player relevante no cenário global de tecnologias navais não tripuladas.

Desafios e Perspectivas Futuras

Os desafios para a MB incluem a necessidade de maior financiamento, regulamentação para operações autônomas e integração de sistemas complexos, como enxames de drones. A comunicação subaquática, limitada pela absorção de sinais na água, é outro obstáculo para os AUVs, exigindo avanços em sensores e baterias. Além disso, questões éticas sobre o uso de sistemas autônomos em cenários de combate demandam debates cuidadosos.

Para o futuro, a MB planeja expandir o uso de VSNTs e AUVs, com foco em operações em enxame e integração com o SisGAAz. A colaboração com a indústria nacional e universidades continuará sendo essencial para desenvolver tecnologias acessíveis e adaptadas às necessidades brasileiras. A aquisição de novos sensores e os testes de operação coordenada são passos importantes para consolidar o Brasil como um player relevante no domínio de sistemas não tripulados.

Os sistemas não tripulados da Marinha do Brasil representam um avanço significativo na defesa naval, segurança marítima, pesquisa oceânica e projeção econômica. Com aplicações que vão desde a vigilância da Amazônia Azul até operações anfíbias, resgate e ciência, essas tecnologias fortalecem a soberania nacional e promovem a autossuficiência.

Apesar dos desafios, a abordagem brasileira, centrada em parcerias acadêmicas e industriais, posiciona a MB como um exemplo de inovação em um contexto de recursos limitados. Com investimentos contínuos, o Brasil tem o potencial de se tornar uma referência em sistemas não tripulados, contribuindo para a segurança global e o desenvolvimento tecnológico.

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